Cantagalo perde parte do seu território para Cordeiro
Um levantamento recente da Fundação Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos do Rio de Janeiro (CEPERJ) e um mapeamento oficial do Serviço Geológico do Brasil (SGB) geram polêmica sobre os limites territoriais entre Cantagalo e Cordeiro, na Região Serrana do Rio de Janeiro. A nova demarcação incluiu áreas antes pertencentes a Cantagalo no território de Cordeiro.
Perda territorial e impacto demográfico
O mapeamento do SGB confirmou a perda de áreas de Cantagalo, incluindo zonas residenciais, comerciais e o bairro Morada do Sol, que agora constam oficialmente como parte de Cordeiro, segundo mostra os levantamentos. O Rio de Janeiro é pioneiro em realizar um mapeamento geomorfológico completo dos municípios, detalhando características de relevo e terrenos, informações disponíveis publicamente aqui.
Além disso, de acordo com o Censo IBGE 2022, Cantagalo registrou uma população de 19.390 habitantes, representando uma queda gradual desde 1991. Em contrapartida, Cordeiro alcançou 22.052 habitantes, evidenciando crescimento populacional. Essa discrepância reflete não apenas em números, mas também nas infraestruturas e na reorganização regional, evidenciando o impacto da redistribuição de terras.
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Erros históricos e controvérsia geográfica
O historiador Celso Frauches, presidente do Instituto Mão de Luva, aponta um “grave erro geográfico” no levantamento do CEPERJ. Ele esclarece que o estudo considera erroneamente o rio Val de Palmas (ou Val de Palmares) como único divisor entre os municípios, ignorando a existência de dois cursos hídricos distintos: o Val de Palmas, que deságua no Rio Macuco, e o Bom Vale, que deságua no Rio Negro. Essa distinção é respaldada por decretos, mapas do IBGE e o Mandado de Segurança nº 277/96.
O saudoso político cantagalense Dr. João Nicolau Guzzo, em seu livro O Sobrado (1998), já alertava para as confusões causadas por mapas imprecisos, feitos na época. Guzzo enfatizou que os limites definidos pelo IBGE e pelo Decreto-lei de 1943 são claros, sendo inadequado utilizar mapas antigos e tecnicamente inferiores para contestar essas delimitações. Entretanto, o novo mapa oficial do Estado, divulgado pelo Serviço Geológico do Brasil (SGB), confirma a mudança.
Nova demarcação
A nova demarcação já afeta sutilmente a dinâmica local. Um exemplo disso é a Secretaria Municipal de Trânsito de Cordeiro funcionar há meses dentro do novo território demarcado, próximo ao bairro Morada do Sol. Outra controvérsia é o pórtico de entrada de Cantagalo, que foi construído mais afastado do local originalmente demarcado – tanto na demarcação anterior quanto na atual do SGB – reforçando a sensação de perda territorial.
A questão do endereçamento nas áreas impactadas pela nova demarcação territorial permanece indefinida. Um exemplo é a antiga controvérsia envolvendo a Rua Cícero Amarante Curty (Rua da Balança), oficialmente registrada como pertencente a Cordeiro, enquanto o bairro Morada do Sol, situado mais adiante, é listado como parte de Cantagalo e recebe serviços públicos do município. O bairro, assim como diversas moradias e empresas ao longo da RJ-160, foram oficialmente reconhecidos pelos órgãos responsáveis como parte do território de Cordeiro.
Ações e silêncio político
A questão foi inicialmente levantada pelo vereador Ciro Fernandes, presidente da Câmara Municipal de Cantagalo, que, juntamente com o prefeito Joaquim Augusto Carvalho de Paula (Guga de Paula), buscou esclarecimentos diretamente com a Fundação CEPERJ no Rio de Janeiro, mas sem sucesso. Até o momento, os Municípios ainda não se pronunciaram oficialmente sobre a mudança nos limites territoriais. Procurada pela reportagem, a Ascom da Prefeitura de Cantagalo não se manifestou. O decreto-lei com as demarcações do CEPERJ pode ser consultado AQUI, e o mapeamento oficial do SGB está disponível AQUI.
Desmembramento de Cantagalo
O atual debate remonta ao histórico de desmembramentos de Cantagalo, que, no passado, foi o maior município da região. Ao longo dos séculos XIX e XX, áreas foram separadas, dando origem a novos municípios como Nova Friburgo, Cordeiro e Bom Jardim. Essa reorganização territorial acompanhou o crescimento econômico e administrativo da região, mas também gerou disputas. No impasse atual, Cantagalo tem aceitado silenciosamente a perda de território para Cordeiro, enquanto enfrenta uma crise moral, ética e política.
Fontes: CEPERJ, SGB e IBGE