Museu Fazenda Bom Jardim: realizações e desafios
A formação do município de Bom Jardim tem início no último quartel do século 18 quando foi concedida uma sesmaria, os denominados latifúndios, ao padre português Vicente Ferreira Soares. O pároco denominou sua herdade de fazenda do Bom Jardim. Surge um arraial em torno da propriedade e o pequeno povoado é elevado à categoria de Curato. Em razão do crescimento populacional recebe o predicado de freguesia pertencendo ao município de Cantagalo. Na Primeira República se emancipa se tornando uma unidade administrativa autônoma com o nome de Bom Jardim.
Na segunda metade do século 19, parte da gleba da fazenda do Bom Jardim foi adquirida pelo açoriano Mathias Corrêa da Rocha. Na sucessão hereditária a propriedade coube a Manoel Corrêa da Rocha e depois ao coronel Luiz Corrêa da Rocha Sobrinho. Na sua gestão além de plantar café, também comprava este produto de outras fazendas, beneficiando-o em sua usina. Tão significativa era a produção da fazenda do Bom Jardim que possuía em frente a usina um trilho ligado a linha principal. Por meio de troles transportava sacas de café até a estação de trem.
Deixando de lado a vetusta morada de seus antepassados, o coronel Luiz Corrêa da Rocha Sobrinho edificou uma luxuosíssima residência, concluída em 1898 na fazenda do Bom Jardim. Ampliando seus investimentos, em 1906 adquiriu o Engenho Central Laranjeiras, de produção de açúcar, no atual município de Itaocara. Na década de 1920, o coronel já com o auxílio de seu filho Péricles Corrêa da Rocha obteve a concessão para venda e manutenção dos automóveis Ford. Outro grande investimento da família foi a construção da usina hidroelétrica no rio Grande, localizada nas proximidades da residência. Forneceram energia elétrica ao município de Bom Jardim de 1923 até o início da década de 1970.
A diversificação dos negócios da família com o passar dos anos compreenderam uma fábrica de balas e ovos de Páscoa, produção de vinho de laranja, uma marca própria de café, entre outros produtos. Em razão deste rico legado da família Corrêa da Rocha, uma gleba da fazenda do Bom Jardim foi adquirida pelo Governo do Estado em 2013 e doada ao município de Bom Jardim para ser transformado em museu. Tem início a formação do Museu Fazenda Bom Jardim.
Além da histórica residência dos Corrêa da Rocha foi incorporado ao museu a outrora usina de beneficiamento de café. Atualmente é utilizada como Galpão Cultural, um espaço para apresentações teatrais, musicais, oficinas de dança, música e teatro, além de ser um espaço para exposições periódicas de arte, fotografia, entre outras atrações culturais.
Fui até o município de Bom Jardim entrevistar o Secretário de Cultura Jackson Vogas de Aguiar, responsável pelo museu. Indagado sobre a restauração, afirmou que as últimas gerações haviam feito muitas intervenções na residência. Segundo ele, para recuperar a arquitetura original oitocentista foi realizada a revitalização do telhado da varanda frontal com serviços de marcenaria, pintura laqueada, pintura ornamental e instalação de mãos francesas. O restaurador Gilson Andrade realizou o processo de decapagem, que consiste em retirar as camadas de tinta sobre a pintura original. Neste processo ficaram visíveis afrescos do século 19 nas paredes da sala de jantar, no corredor, na varanda, nos quartos, na sala de estar e na parte externa. Foram igualmente realizadas recomposições de alguns elementos arquitetônicos da residência. A usina hidroelétrica foi restaurada, mas é de propriedade particular.
Fiquei encantada com o museu. Na sala principal e nos quartos permaneceram boa parte do mobiliário dos Corrêa da Rocha. Elementos art déco nas pias são um verdadeiro charme. Um amplo salão apresenta a genealogia da família, assim como uma linha do tempo de sua história. Objetos pessoais como a preciosíssima espada da guarda nacional do coronel Luiz Corrêa da Rocha Sobrinho é um dos destaques, assim como um piano. Jackson Vogas fez questão de apresentar em outras salas aspectos da história local, como a história dos ofícios, religiosidade e, como não podia deixar de ser, uma sala dedicada ao café. Os atores políticos locais do Império e Primeira República também ganharam uma sala, bem como um centro de documentação para uso de pesquisadores.
Mas o grande desafio do Secretário de Cultura Jackson Vogas é tornar o complexo em uma instituição de guarda. Tudo tem início em 2010 quando foi localizado em São José do Ribeirão, distrito de Bom Jardim, na propriedade dos Tardin, um cemitério indígena com urnas funerárias em cerâmicas. Trata-se de um acervo arqueológico pré-colonial com artefatos das etnias Puri e Coroado. Foi realizada uma prospecção pelo Instituto de Arqueologia Brasileira tendo sido localizadas 13 urnas funerárias com fragmentos de ossos humanos, pontas de flecha, uma enxó, um cachimbo, entre outros artefatos.
Estando sob a guarda do IAB, Jackson Vogas se empenha em trazer para o Museu Fazenda Bom Jardim todo o acervo localizado nesta prospecção. Para tanto está trabalhando para se tornar uma instituição de guarda. Necessita investir em um sistema de climatização na sala da reserva técnica, na instalação de pisos e forração antichamas, em mecanismos hidráulicos para segurança contra incêndio, monitoramento e segurança contra furto, adquirir apólice seguro, entre outras exigências. O secretário já iniciou esta adequação, e em atendendo à legislação federal, colocará o Museu Fazenda Bom Jardim entre os mais importantes museus do país, pela grandiosidade de seu acervo pré-colonial.