Frutos, legumes e hortaliças: breve história da alimentação
Os portugueses foram importantes agentes de dispersão trazendo plantas e animais para o Brasil, assim como exportando desta colônia para suas outras possessões. Neste artigo vamos nos limitar apenas às frutas, hortaliças, legumes, bulbos e especiarias nestas trocas alimentares. Eram nativos do Brasil o caju, o mamão, o maracujá e o abacaxi que foram levados para Goa, na Índia, vindo de lá a manga. Tudo indica que a jabuticaba é igualmente nativa. Algumas espécies africanas e asiáticas aclimatadas em Portugal foram enviadas para o Brasil como a laranja, o limão, o gergelim e o arroz. O cacau da América espanhola seria somente introduzido e cultivado no sul da Bahia em 1780, mas levaria mais de um século e meio até se tornar um produto de exportação. De todos os produtos coloniais o mais valioso é a cana-de-açúcar plantada para render um excedente para exportação. Vieram diretamente do continente africano o inhame, a banana, o coqueiro, o dendê, o gengibre, o quiabo, o feijão-fradinho, a mamona, o caruru e a bertalha. No século 19, Macaé de Cima em Nova Friburgo era conhecida como terras dos inhames, assim como há referência da localidade de Inhames no primeiro distrito desse município. Essa iguaria que significa “comer” vem de ñame, iñame, igname, yame, yam, yams até chegar a inhame.
Do Brasil poucas espécies foram encaminhadas para a África a exemplo do amendoim, do abacaxi e da mandioca. Este último produto, como no Brasil se torna um gênero de primeira necessidade no continente africano. Os portugueses também trouxeram para o Brasil o marmelo, o figo, o damasco, o pêssego, o melão, a pera, a tâmara e a romã. No final do século 19 há o registro de cultivo de pera, maçã, nozes, cereja, marmelo, amora e uva nas terras frias, hoje distrito do Campo do Coelho dando-lhe uma paisagem que se assemelhava às planícies europeias. Nossas florestas eram prolíficas. Inúmeros frutos da floresta deixaram de ser comercializados o mocuguê, a sapucaia, a pitomba, o araçá, o ibacurupari, a ibanemixama, o imbu, o araticum, o guri, o caía, a iapina, o audá, o ingá, o juá, a maçaramduba, o murici, o ibaraé, o guabiraba e a guabiroba. Da cabreúva e da copaíba se extraíam bálsamos aromáticos. Dois terços dos nomes das árvores, plantas, animais, rios e topônimos são de origem tupi-guarani. Sapucaia vem do tupi “fruto que faz saltar o olho”. Esses frutos são cápsulas lenhosas, contendo sementes semelhantes a castanhas e são comestíveis. O coco de sapucaias era o favorito dos indígenas. O africanismo era igualmente aplicado a nomes de lugares e acidentes geográficos como murundu e cafundó, e de animais como camundongo e marimbondo. O luso-brasileiro importou do dialeto quimbundo o nome de um alimento proveniente do milho, o fubá, que faz o prato denominado de angu.
O milho era muito cultivado em Nova Friburgo e comercializado para alimentar as tropas de muares. Os colonos suíços contribuíam com a economia local principalmente com a cultura do milho e subsidiariamente com o plantio de batata, feijão e a produção de mantas de toucinho, influência da charcuterie portuguesa. Por falar em fubá, em São Pedro da Serra fazia-se o “brissi”, uma massa de fubá com torresmo e assada no forno. Na década de 1830, o município de Nova Friburgo cultivava café, milho, cana-de-açúcar, feijão, batata, arroz, tabaco, mamona, realizando-se experiências na produção de chá, trigo, centeio e com criação de gado bovino e mulas. D. João VI trouxe o chá contratando especialistas chineses para ensinar o seu plantio. Um oficial português, Luiz d’Abreu, capturado pelos franceses e preso nas ilhas Maurício conseguiu fugir e roubar algumas sementes antes de deixar a ilha. Veio para o Rio de Janeiro em 1809 trazendo em sua bagagem sementes de cravo, canela, noz-moscada, damasco, castanha, fruta-pão, cânfora, toranja, abricó, abacate, sagüeiro e cajá-manga. Presenteou D. João VI com a Roystonea oleracea, uma palmeira nobre de altura imponente que passou a ser plantada nas fazendas dos aristocratas do café.
De origem asiática os portugueses trouxeram o chuchu, a jaca, o jambo-rosa e a soja. O nome local para a soja era “amendoim de Angola” sugerindo uma transferência via África. Igualmente recebemos do colonizador hortaliças como mostarda, chicória, couve, acelga, espinafre, alface, salsa, hortelã, cebolinha; legumes como berinjela, abóbora, nabo, cenoura, repolho, pepino e temperos como cominho, cebola, alho, colza, endro, açafrão, coentro, pimenta do reino, canela e rosas para a água medicinal. Não faltaram as uvas e o trigo. Crisophyllum imperiale ou guapeba imperial era a fruta preferida de D. Pedro I e seu filho D. Pedro II. Nativa da Mata Atlântica entre o Rio de Janeiro de Minas Gerais está ameaçada de extinção. Durante o Segundo Império já era rara pelo fato da madeira ser utilizada na construção de navios. Uma árvore que me encantou quando visitei a histórica Fazenda Canteiro(RJ) foi a de urucum, utilizado como tempero e que os indígenas faziam uso para pintar o corpo. Na também histórica Fazenda São Clemente(RJ) tive a oportunidade de experimentar a ameixa-de-Madagascar no pomar-parque que possui árvores frutíferas de países africanos e asiáticos, importados no século 19. Nativa da África tropical e de Madagascar são saborosíssimas, com a polpa muito suculenta. Seus frutos são arredondados de cor inicialmente vermelha, depois purpúreo-escura quando maduros. O arbusto era utilizado pelo paisagista Auguste François Marie Glaziou, que servia a Imperador D. Pedro II e que projetou esse pomar-parque. Como dito antes, inúmeras frutas de nossas florestas não entraram na cadeia de comercialização e algumas são encontradas muito raramente em mercados como frutas exóticas. O colonizador português preferiu ter em seu pomar as frutas trazidas nas trocas alimentares.
- Janaína Botelho: roteirista, historiadora e professora
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