Mostra de Café na Serra na histórica Fazenda Bom Jardim
O município de Bom Jardim nos dias 6 e 7 de novembro irá sediar no Complexo Cultural Fazenda Bom Jardim, a 1ª Mostra de Qualidade de Café da Região Serrana do Rio de Janeiro. Este evento, na sua primeira edição, objetiva divulgar a produção de café da serra fluminense, apresentar cafés especiais, agregar valor aos produtos e melhorar a percepção das marcas junto ao público consumidor. Além de discutir a qualificação técnica de tipos de cafés ocorrerão palestras e oficinas. A região serrana fluminense contribui com a produção de café no estado do Rio de Janeiro representada pelos municípios de Bom Jardim, Petrópolis e São José do Vale do Rio Preto. Na programação estão previstas as palestras, “Panorama do consumo de cafés especiais no Rio de Janeiro”, com Marceli Ângelo, gestora do projeto Cafés Especiais do Sebrae; “Indicação geográfica do café na Região Serrana”, com Celso Merola, engenheiro agrônomo e “Métodos de extração de café”, com Emerson Freitas. A agricultura sustentável é comtemplada com a palestra do engenheiro agrônomo Leandro Torres, consultor técnico da Fazenda Monthal, que vai discorrer sobre “Café Sustentável no Sistema da Agro Floresta”. Eli Ferrari da Fergas Comércio de Café fará a apresentação dos cafés, qualificação técnica e a premiação dos produtores.
Como Bom Jardim sediará o evento, este artigo vai se limitar à sua história. Na região onde se localiza este município se estabeleceram os primeiros sesmeiros, se afazendando, conhecida como sertões do Macacu. Estes sertões, antes habitado somente por indígenas das etnias Puri e Coroado, passa a ser povoado no último quartel do século 18, em razão da exploração do ouro de aluvião nos afluentes dos rios Grande e Negro. Com o esgotamento deste minério, os sesmeiros mudam a atividade econômica de suas propriedades para a lavoura branca e novas concessões de sesmarias são distribuídas como forma de estimular o povoamento. Mathias Corrêa da Rocha possivelmente foi um dos primeiros a obter sesmarias nos sertões do Macacu. Paulatinamente os indígenas vão sendo expulsos e o primeiro município que surge na região é Cantagalo, em 1814, onde Bom Jardim integra o seu território. Seis anos depois ocorre o primeiro desmembramento de Cantagalo para formar uma colônia de suíços, no qual se dá o nome de Nova Friburgo, em homenagem ao cantão de Fribourg, de onde veio a maior parte dos colonos. A seguir recebe colonos alemães que vem ocupar as glebas abandonadas pelos suíços. O município de Cantagalo começa a dar sinais de prosperidade em razão do cultivo do café, produto que se tornará o mais importante item de exportação no Império.
Com uma altitude muito mais baixa e com terras quentes, ideal para o café, algumas famílias suíças seguidas por alemãs abandonam Nova Friburgo para investir sua força de trabalho em Cantagalo, na freguesia de São Francisco de Paula. Para esta freguesia foram colonos suíços das famílias Monnerat, Frottè, Sanglard, Combat, Marchon, Bohrer, Marfort, Berçot e as famílias alemãs Erthal, Brust, Emmerich, Hoeltz, Schumacker, Eller, Asth, Heckert, Shottz, Gripp e Winter. Décadas depois, imigrantes italianos, a exemplo dos Carrielo, se dirigiram também para esta região. Em 1875 é inaugurado o ramal ferroviário entre Nova Friburgo e Bom Jardim. Em torno da estação desenvolve-se um povoado e em 1886, Bom Jardim é elevado a distrito policial de Cantagalo. Com o golpe militar e a instalação da República tem início um movimento de emancipação, com freguesias se transformando em município. O distrito de Bom Jardim se desmembra de Cantagalo e ganha o predicado de município, instalado em 05 de março de 1893, anexando a freguesia de São José do Ribeirão, que pertencia a Nova Friburgo, como parte de seu território. Esta freguesia era uma das mais importantes produtoras de café de Friburgo e com o maior plantel de escravos.
Derrubada a mata foram plantadas mudas de café nos morros meio-laranjas. Ao fim do terceiro ano, os arbustos já produzem frutos, atingindo plena produção no sexto. No século 19 calculava-se entre 25 a 40 anos a duração de um cafeeiro produtivo. Atualmente, com novas técnicas, como a poda dos arbustos através do método de “esqueletamento”, e adubagem da terra, os cafeeiros atingem maior longevidade. No passado, as mudas eram plantadas em linhas retas, perpendiculares aos pés dos morros e dispostas em fileiras verticais com um espaço aproximado de dois a três metros entre cada uma delas. Esta forma de plantio era extremamente inadequada às condições climáticas da região, que é marcada pela presença de fortes chuvas torrenciais. Plantar pés de café de forma enfileirada no sentido vertical nas encostas e não em curva de nível, que seria o correto, provocava forte erosão nos morros, tornando os solos improdutivos e assoreando os rios próximos. Essa prática agrícola era utilizada para facilitar os feitores em sua tarefa de exercer melhor controle do trabalho dos escravos.
Entre os colonos que se dirigiram para a freguesia de São Francisco de Paula, em Cantafalo, o que mais prosperou foi Joseph Erthal. Nasceu em 1760, em Baden, na Alemanha ainda não unificada. No Brasil casa-se com a conterrânea Anna Barbara Muller, deixando vasta descendência. Trabalha como ferreiro e com o pecúlio que acumula neste ofício, muito útil aos tropeiros, adquiriu uma propriedade agrícola passando a cultivar o café. A partir do patriarca, a família Erthal durante sucessivas gerações vem se dedicando a esta mesma atividade econômica no município de Bom Jardim. Cumpre destacar que entre 1830 e 1880, Cantagalo foi um dos maiores produtores de café do Brasil. Já a tradicional família Corrêa da Rocha, proprietários da fazenda Bom Jardim, produziram o café da marca LUCO.
Miguel Erthal, tetraneto do patriarca Joseph Erthal é o responsável pela administração de nove fazendas da família cultivando o que denomina de “café de montanha”. Segundo ele, este produto é uma das commodities mais especuladas no mercado internacional. O Brasil compete neste mercado com a Índia, Vietnã, Colômbia, Guatemala e Honduras, que utilizam uma mão-de-obra muito mais barata. Considerando que a mão-de-obra no café de montanha representa 60% do custo do café, a competitividade no mercado internacional está cada vez mais difícil. Os Erthal exportam para o Japão, Alemanha e Estados Unidos, este último o maior comprador de café no mundo. Como o Brasil é o segundo maior consumidor mundial, os Erthal se ocupam igualmente do mercado interno, produzindo o café Bomjardinense e Monthal. Quando entrevistei o pai de Miguel, o senhor Aloísio Erthal, ele me disse algo curioso sobre o que se dizia no passado, “o café tem praga de escravo e capa de velhaco”. Praga de escravo devido a exploração do trabalho servil nas lavouras de café. Capa de velhaco porque os cafeicultores ficavam nas mãos dos comissários de café. Na Mostra de Qualidade de Café da Região Serrana, o dia 6 é fechado aos cafeicultores, por ser um evento técnico. Já no dia seguinte é aberto ao público de 9h00 às 17h00, com exposição de produtos locais e regionais, atrações culturais, artesanato e cerveja artesanal. É obrigatório o uso de máscara e o cumprimento de todos os protocolos de prevenção da Covid-19.
- Janaína Botelho: roteirista, historiadora e professora da UCAM
- Email: [email protected]
- Blog: jbhistoriadora.wixsite.com/janainabotelho
- Instagram: @janainabotelhohistoriadora
- Youtube: Janaína Botelho