Trabalho arqueológico no Palácio de Cristal encontra mais de 2 mil peças históricas
O trabalho de resgate da história do Palácio de Cristal em Petrópolis – o que significa parte da história do Brasil Império – teve nesta quarta-feira (29/9) sua primeira parte concluída. A equipe de arqueologia que faz o peneiramento em busca de descobertas desse quebra-cabeça histórico concluiu a análise dos 324 metros de trincheiras no aterro que compõe o jardim. Um trabalho que teve início em maio e que já resultou em mais de 2 mil peças encontradas. Entre elas, pedaços de louças inglesas usadas pela elite do século XIX, de stoneware — cerâmica que vinha, nessa época, da Alemanha, Bélgica e Holanda —, faianças mais brutas, ferraduras, vidros (que podem ser originais do palácio) e até um cachimbo de porcelana.
As escavações arqueológicas ao redor do palácio, que é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan e que foi inaugurado em 1884 pela Princesa Isabel, têm trazido à tona fragmentos do passado. “Encontramos materiais da primeira metade do século XIX, como fragmentos de louça inglesa. E, possivelmente, até do século XVIII”, diz Giovani Scaramella, diretor da empresa Grifo Arqueologia, que destaca que a partir de agora as escavações acontecem no principal acesso ao palácio. “Foi traçada a demarcação para uma nova trincheira. Está com um metro de largura, um metro e meio de profundidade e 25 metros de comprimento. É um trabalho mais minucioso, para buscar a história em camadas anteriores a construção e utilização desse espaço nos séculos passados”.
O que se espera dessa nova etapa de escavação é entender a formação do relevo original e como os aterros realizados ao longo de mais de 100 anos configuraram o espaço que conhecemos hoje. “Essa área pode ter recebido materiais de outros pontos de Petrópolis por ter passado por aterros. E esses aterros podem estar ligados a inundações na cidade e a remodelamentos da praça. Há ainda chance de terem levado junto louças de famílias que viviam em Petrópolis. O objetivo agora é fazer sondagens mais profundas próximas à entrada, indo além dos 60 centímetros, atingindo um metro e meio e chegando a materiais mais antigos, relacionados à história da praça”, informa o mestre em arqueologia Kedma Gomes, que veio de Lisboa e coordena desde maio os trabalhos no Palácio de Cristal.
Descobertas em exposição
Uma pequena parcela das descobertas feitas até agora foi colocada em exposição na frente do palácio. “Parte do material que encontramos, como fragmentos de xícara, de faiança fina, europeia, e de faiança histórica, porcelanas, azulejo português e mesmo um fragmento de anilha de esgoto antiga estão expostos em painéis, para que as pessoas que hoje ainda não podem revisitar o espaço tenham uma boa ideia do trabalho que estamos realizando aqui”, destaca Kedma que diz que há também muito vidro plano, que pode ser do próprio palácio, que passou por restaurações ao longo dos anos. “Nessa nova etapa, tentamos encontrar a base original do cruzeiro que fica na frente do palácio, além dos alicerces do que foi a entrada original do Palácio”.
A história do espaço
A Praça da Confluência, que ficava no lugar onde se encontravam os rios Quitandinha e Piabanha, surgiu em 1846. “E a primeira notícia de uma atividade oficial na praça foi uma missa em homenagem à vinda dos colonos alemães. Como eles eram protestantes, depois passaram a ser celebrados cultos no local. Até que começaram a acontecer, por volta de 1870, exposições de hortícolas, como frutas legumes, plantas e flores. Era como se fosse uma feira de elite”, contextualiza a historiadora e educadora patrimonial da Grifo, Roselene Martins.
Ela lembra que essas exposições, que ocorriam uma vez por ano, faziam tanto sucesso que, a partir da ideia de Pedro II de um espaço permanente para elas, o Conde d’Eu, marido da Princesa Isabel e presidente da Sociedade Agrícola de Petrópolis, inspirado no Crystal Palace de Londres, encomendou às oficinas da Société Anonyme de Saint-Sauveur, na cidade de Arras, na França, o palácio pré-fabricado. “O palácio representa um momento em que a monarquia estava se mostrando atual para o século XIX. Trazer esse prédio de vidro e ferro inspirado nos ingleses, que eram o suprassumo da revolução industrial, simbolizava uma monarquia moderna, o que deveria ser a marca do Segundo Reinado”, afirma Roselene.
A Quarta Exposição da Sociedade Agrícola e Hortícola de Petrópolis, a primeira ali, em 1884, teve a presença do imperador e dos seus ministros e corpo diplomático. A ornamentação ficou a cargo do botânico francês Auguste François Marie Glaziou. Outro grande evento no espaço ocorreu no chuvoso domingo de Páscoa de 1888: a Princesa Isabel e o Conde d´Eu, na companhia dos filhos, entregaram 127 cartas de alforria a escravizados da cidade. O advento da República, em 1889, marca o início de um longo período de decadência da imponente construção. Em 2019, o palácio recebeu cerca de 120 mil pessoas, boa parte para a Bauernfest, Festa do Colono Alemão).
Fonte: Sou de Petrópolis