Praça do João XXIII: por dentro das memórias do Jardim de Cantagalo
Hoje nossa coluna é cheia de memória e afeto. De tempos que se foram, mas também dos que virão, e até do nosso presente. Nosso tema é a Praça João XXIII (já foi chamada de Praça dos Melros), de Cantagalo, na Região Serrana do Rio, tão admirada por quem vive na cidade, por aqueles que todos os dias passam pelo seu interior ou quem a visita vindo de outros lugares. Essa praça, ou como é afetuosamente chamada: “O Jardim”, é um lugar de afeto, sendo o primeiro local de brincadeiras, amizades – e até namoros – de muitos cantagalenses e moradores de cidades vizinhas. Muitas memórias foram e são cultivadas neste local.
Embora existam muitas lacunas na história documentada sobre o Jardim de Cantagalo, podemos contá-la através de alguns fatos, como o de sua construção ser creditada ao 2º Barão de Cantagalo, Augusto de Souza Brandão, ainda no século XIX. Ou, que em seus primeiros anos, o Jardim era cercado por uma grade de ferro, retirada em 1930, por ordem do prefeito Acácio Ferreira Dias, sendo ela colocada no adro da Igreja Matriz de Cordeiro. Podemos dizer também que o coreto, construído em 1928, que já serviu de palco para muitas apresentações, hoje é o único patrimônio no centro da cidade histórica bicentenária, que é registrado pelo INEPAC (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural).
São muitos os fatos que enriquecem os canteiros da história do Jardim, como a inauguração da Herma (busto) de Euclides da Cunha em 1919, quando foi cantado pela primeira vez o Hino do Cantagalo, ou o plantio, em 1935, de uma muda de alfarrobeira, doada pela professora Amélia Tomás. Há fatos contados pela tradição oral que dizem que essa alfarrobeira foi plantada a partir de sementes trazidas de Cuba, em 1855, pelo Conde de Nova Friburgo. Outra curiosidade sobre os canteiros encontra-se no próprio terreno: uma generosa camada de solo foi acrescentada à sua composição original, na década de 1940, e com a elevação dos canteiros, surgiram os famosos “murinhos do Jardim”. A origem desse substrato também tem história: ela provém do antigo “morro do cemitério” que era localizado onde hoje se situa hoje o Colégio Municipal Lameira de Andrade. Quando o terreno foi preparado para a construção do colégio, a terra removida foi colocada no Jardim, e os restos mortais que lá existiam foram transferidos para o cemitério novo. Na época, muitas pessoas acharam, erroneamente, que poderiam se contaminar com essa terra, uma vez que no cemitério antigo foram enterrados muitos dos que faleceram no surto de febre amarela, na virada do século XIX para o XX. Apesar da comoção que pode ter gerando na época, o tempo provou que as preocupações eram infundadas.
A Praça João XXIII, tem em sua história a memória de outros nomes como Praça XV de Novembro, Parque Euclides da Cunha e Praça dos Melros. No entanto, na memória afetiva de muitas pessoas, de todas as idades, sendo morador da cidade, ou não, a praça sempre será “O jardim Cantagalo”. Alguns chegam a questionar se origem do seu nome seria porque ocupa uma posição central na cidade, ou se seria uma alusão ao Jardim do Barão, como extensão da sua casa no centro da cidade e que hoje acolhe o Fórum da Cidade. Quem sabe surgem novos fatos ou documentos que esclareçam essa dúvida?
Independente das confirmações históricas, por tradição oral ou acadêmicas, é fato que a Praça João XXIII é o Jardim de Cantagalo e por isso devemos ter todo zelo com ele. Um jardim é sempre um bom cartão de visita para uma casa. Então, o que seria um jardim de uma cidade? No caso do Jardim de Cantagalo, além de um cartão de visita e um cartão postal, é um lugar de memória – de muitas memórias. Portanto, além do zelo, é preciso aliar o saber ao cuidado, para que, além do patrimônio vivo ali encontrado, também seja preservada a memória nele consolidada ao longo dos séculos, como um rico testemunho entre a relação de História, Cultura e a Natureza.